terça-feira, 17 de dezembro de 2013

[Eu Cinza] Mais do Capítulo 6

Antes de ir embora para casa,procuro pelo médico que atende Gabriel. O encontro na ala de espera falando com um homem. Quando me aproximo,o homem que esta com ele faz um gesto indicando que estou me aproximando e ele vira.
- Em que posso ajudá-la? - ele me da um sorriso de má vontade.
- Eu queria saber quando o Gabriel vai ter alta. - ele olha para mim fingindo estar confuso.
- Gabriel? O paralitico? - ele me da um olhar de desdem e tenho vontade de socar o meio da sua cara.
- Ele mesmo.
- Bem. Como eu havia dito a você ele já é um caso perdido. Só com um milagre de Deus para ele voltar a andar. Por isso,vou providenciar para que lhe deem alta amanha a tarde. Os pai dele ja chegaram?
- Nao. Ainda nao. Obrigada pela informaçao!
- De nada,querida! - ele me olha dos pés a cabeça com uma cara de nojo e se vira de volta para o homem com que falava. Mas antes de sair ouço ele dizer:
- Essa coitada deveria deixar aquele garoto aleijado para lá enquanto tem tempo!
Eu fico chateda ao ouvir ele falar dessa maneira de Gabriel. Eu ficaria com raiva ao ouvir ele falar assim de qualquer pessoa. É muito baixo para uma pessoa,ainda mais um medico,ficar falando de alguem que nao pode se defender,nem esculta-lo. Mas, ao mesmo tempo em que fico revoltada,nao consigo deixar de pensar em suas palavras. Será que eu deveria deixa-lo enquanto ainda posso?
Contudo,eu jamais conseguiria conviver com a culpa e o remorso me remoendo,caso o fizesse. Pior,nao conseguiria viver sem a presença dele ao meu lado. Ele é o meu maior incentivo para tentar ser uma pessoa melhor. Um anjo que cuida de mim quando ninguem mais o faz. Agora ele precisa de mim e tenho que ser forte e tentar aprender com as suas dificuldades.
Quando chego em casa ando por ela me sentindo muito solitaria. Se pudesse traria Gabriel do hospital para cá. Eu realmente nao sei como eu vou fazer para encontrar com ele todos os dias. Nao me sinto a vontade com a ideia de ficar indo para casa dele sempre. Eu terei que dar um jeito para traze-lo de vez em quando para cá ou para dar um passeio.
É muito estranho para mim a ideia de ter que "carregá-lo" por aí. Não gosto de pensar em como ele era antes por que isso so dificulta mais para que eu me acostume com a situacao. Amanha verei ele pela primeira vez na cadeira de rodas. Imagino como ele estará se sentindo. Como eu vou me sentir com isso.
Preparo alguma coisa para comer. Por sorte sei me virar razoavelmente bem na cozinha. Provavelmente,mamae irá chegar depois de amanha e nao terei mais essa preocupaçao.
Como devagar e a comida cai em meu estomago como pedras jogadas em um lago. Ainda nao consigo tirar Gabriel de minha mente,e parece que eu posso enlouquecer. Deixo metade do que coloquei no prato e vou em direçao a meu quarto. Paro quando passo em frente ao espelho e nao reconheço a imagem que vejo. A garota que vejo esta tao palida e abatida que mal consigo achar semelhanças entre ela e eu. Levanto o braço e ela faz o mesmo. Me aproximo dela e toco o vidro gelado,e encosto minha testa nele. "Em que eu irei me transformar ao longo de tantas preocupaçoes que terei que aprender a lidar?",eu penso e quase posso ouvir uma voz sussurrar em meu ouvido: " Numa sombra de si mesma."
Me jogo na cama cansada demais para tentar refletir sobre minha propria situação. Pego no sono quase imediatamente e tenho um sonho. Estou parada no meio da trilha durante uma tempestade. O vento me açoita firmemente,enquanto tento assimilar a situaçao.O primeiro pensamento que me ocorre é que eu deveria sair daqui,é muito perigoso ficar embaixo de uma arvore durante uma tempestade,ainda pior tendo varias ao seu redor. Antes de poder sair do lugar esculto um trovão tao alto que me arrepio por inteiro. Mas ele nao passa,apenas fica mais alto a cada segundo. Sinto meus ouvidos pulsarem e me agacho no chao com as maos tampando os ouvidos. É enlouquecedor.
No começo da trilha,avisto uma silhueta escura. Aos poucos,em meio a chuva,consigo distinguir quem é.
Gabriel se aproxima em uma cadeira de rodas e com roupas totalmente negras. Parece que a tempestade vem diretamente dele. Me levanto e destampo meus ouvidos depois que percebo que o trovao passou. Ele esta com a cabeça abaixada e se move como se estivesse sendo empurrado pelo proprio vento. Quero gritar seu nome,mas nao encontro minha voz. Tento sair do lugar,mas minhas pernas estao como se estivessem coladas no chao.
Ele se aproxima mais ate que para em minha frente. Movo um dos meus braços em direçao a sua cabeça ainda abaixada e ele a levanta. Me encara com uma expressao tao horrivel que faltam palavrs para descreve-la. Ele fala sem abrir a boca.
- Eu serei o seu pior pesadelo!
Acordo com um grito estrangulado e percebo que já é noite. Estou completamente molhada de suor,minha respiração esta agitada e meu coraçao esta a mil. Levanto da cama e vou em direçao ao banheiro para tomar um banho. Estou tão assustada que deixo o sabonete cair algumas vezes antes que minhas maos parem de tremer. Enquanto a agua desce por meu rosto imagino ela lavando mais que a sujeira do corpo,mas tambem a da minha alma e dos meus pensamentos.
Eu ja tive varios pesadelos antes,mas esse muito real. Cada gota de chuva,e cada palavra que Gabriel disse. Nao consigo imagina-lo na vida real tao sobrenatural quanto no sonho,mas parecia ele ainda. Na verdade,pareceu como um aviso de que as coisas vao ficar bem dificeis. Eu sei no meu intimo que nao sera nada facil para nenhum de nos. Mas eu nao quero mais ter sonhos como esses. " E se eu tive-los todas as noites depois que eu escolhi ficar ao lado dele?",penso.
Eu nao posso me dar o luxo de ficar com medo agora. Eu prometi a ele que nao iria fugir. Que eu ia enfrentar todos os olhares direcionados a nos por que eu gosto dele. Nao posso me esquecer disso.
Saio do banho,me troco e vou ver tv. Ja é tarde mas nao quero voltar a dormir. Quem sabe o que estara me esperando na escuridao da minha mente. Mas de qualquer forma acabo dormindo no sofá;um sono sem sonhos.

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