quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

[Eu Cinza] Continuação do Capitulo 4 e Capitulo 5

As aulas finalmente acabam. E resolvo nao ir para casa. Minha mae irá interpretar como um gesto de que nao estou querendo cooperar,mas nao me importo com isso. Quero ficar sozinha mais a vez. Ir ao unico lugar que tenho para chamar de meu e que ainda assim nao o é. Espero na biblioteca se passar meia hora para que eu possa ir para o ponto de onibus. A essa hora Gabriel deve ter ido para casa. Em pensar que ele nao veio me procurar para irmos juntos. Penso que deve ter ido com Juliana e meu sangue ferve.
Ao chegar na trilha,olho para tras como se esperando a chegada de alguem. Aquele que nao virá. Comprei algum lanche no caminho ate a parada e vou me acomodar embaixo da minha arvore. Coloco a mochila no chao e repouso minha cabeça nela. Me sinto cansada e acabo pegando no sono.
Sinto algo raspar o meu nariz,abro os olhos de repente e vejo uma mao proxima ao meu rosto com algo balançando. Me afasto e vejo Gabriel. Ele estava passando um gravetinho no meu rosto. Ele esta sorrindo alegremente para mim como se nao tivesse me ignorado todo o dia.
- O que voce esta fazendo aqui? - digo irritada com ele
- Calma! Eu sabia que voce viria ate aqui. - ele olha para sua mao que  balança o gravetinho insistentemente nos dedos. - Eu sabia que se voce me visse ao lado de outra pessoa voce iria fugir. - ele me encara procurando alguma reaçao em meu rosto - Você sempre foge quando nao quer lidar com alguma coisa.
- Voce fez de propisito? Ficar com a Juliana para eu vir para cá? Por que? - digo intrigada porque realmente nao entendo. Ele me olha por varios segundos nao desviando seu olhar do meu. Ele se senta mais proximo a mim,na minha frente,e brinca com um cacho do meu cabelo.
- Sim,foi de proposito. Eu queria que voce viesse aqui para que eu pudesse... para que eu te dissesse... - ele se atrapalha com as palavras e eu advinho o que ele esta prestes a dizer. - Laura,você quer namorar comigo?
Eu coro quando ouço suas palavras. Ele olha para mim pedindo uma resposta. E eu nao sei o que dizer. Eu gosto dele,mas essas coisas sao tao embaraçosas para mim. Eu olho para o chao a procura de um graveto. Faço um desenho entre nós dois. Um coraçao. Ele pega seu proprio graveto e escreve nossos nomes nele. Nao consigo levantar a cabeça e olhar para ele. Mas eu nao preciso. Ele ergue meu queixo de leve com uma das suas maos,e seus olhos viajam ate os meus. Me levanto um pouco e o beijo. Me sinto leve,viajando em algo totalmente desconhecido. Toco seu peito com uma de minhas maos e sinto seu coraçao acelerado tanto quanto o meu. Ele me beija insiatentemente,e eu me pego suspirando entre labios. Ele para,segura meu rosto e diz:
- Eu te amo! E nao sei como nao pude ver isso antes.
- Eu tambem. - e eu nao poderia ser mais sincera ao dizer isso.
O chamei para subir na arvore. Sei lá porque,mas eu senti vontade e ele nao recusou. Sentamos em um galho nao muito alto. Ele me envolveu com cuidado com um de seus braços e aninhei minha cabeça em seu peito. Nunca me senti tao feliz na minha vida como nesse momento. Ele pega uma de minhas maos e faz circulos imaginarios na palma enquanto me pergunta varias coisas que nunca falamos antes. Sobre como foi nosso primeiro beijo (ele me disse que mordeu o labio da menina que ele beijou),sobre natureza,meu gosto por desenho,e ele me disse que sabe tocar violão coisa que nunca o vi fazer. O fiz prometer tocar algo aqui para mim qualquer dia,em troca ele quer ir ver os meus rabiscos na parede do meu quarto. Eu mencionei meio sem querer que tem nossos nomes lá. Quando o por do sol ja esta perto resolvemos ir embora. Aqui nao da para vê-lo por causa das arvores. Nao faria sentido ficar mais tempo. Entao seguimos na trilha de mãos dadas.
Quando chego em casa o portao esta trancado. Um bom sinal. Eu tenho uma copia da chave desde que resolvi sair por aí por conta propria. Na mesa,tem um lanche que deve ser para mim. Uma xicara com nescau e bolo. E mais um bilhete. Parece que agora essa é a maneira que minha mae arrumou para nao deixar de falar comigo de vez. O abro.
"Resolvi fazer para voce como um sinal de trégua entre nos. Voce ainda é minha filha e se quiser falar comigo estarei a disposicao. E eu sei que voce anda por ai com o Gabriel."
Eu rio,porque ela nunca falou comigo assim. Nunca perguntou sobre nenhum garoto que ja tenha passado pela minha vida. Para falar a verdade,eu nao lembro de nenhuma conversa agradavel entre nos. Resolvo que depois irei falar com ela por causa do que Gabi disse. Que eu devo mudar. Prometo a mim mesma tentar. Eu so tenho ela no mundo,e ela tambem so tem a mim.
Penso em ligar para Gabi,mas nao quero parecer tao apressada. Nos vimos a menos de duas horas. Mas acabo enviando um torpedo para ele.
"Parece que as coisas estao abrandando por aqui. Estava pensando de sairmos a noite o que acha?"
Olho para o celular ansiosa pela resposta. É a primeira vez que eu tomo a iniciativa de chamar alguem para sair mesmo que seja apenas Gabi que conheço de tanto tempo que ja parece ser de sempre. Passasse meia hora e começo a estranhar. Ele nunca demora a responder. Ate onde lembro ele nao se separa do seu celular por nada. É viciado naqueles joguinhos de corrida que so meninoa conseguem ver alguma graça. Tem algo de errado aí.
Tento agora ligar para ele. Chama ate que cai na caixa postal. Insisto mais algumas vezes e nenhuma resposta. Penso comigo, "Ele deve estar ocupado ou pode ter esquecido ele em casa. Coisas assim acontecem sempre." Entao,vou tomar um banho e tento afastar os maus pensamentos.
Quando volto verifico meu celular e nenhuma mensagem ou ligaçao. Fico realmente preocupada,e decido ir ate a casa dele. Quem sabe os pais dele me deem uma informacao. Pego um papel e escrevo um bilhete para minha mae.
"Fui ate a casa do Gabriel. Volto logo,e nao se preocupe."
Nao quero que ela fique preocupada agora que decidi manter as coisas calmas entre nos. A casa de Gabriel fica um pouco distante da minha e demoro cerca de vinte minutos para chegar ate la. Bato no portao algumas vezes e parece nao ter ninguem em casa. Vou ate a casa vizinha para tentar descobrir alguma coisa. Depois de duas batidas,o que parece ser uma mulher idosa pergunta de dentro da casa com a voz um tanto desconfiada.
- Quem é?
- So quero lhe perguntar uma coisa. Sou amiga do seu vizinho Gabriel. - falo. Ouço a porta sendo destrancada e uma senhora de meia idade aparece.
- O que quer saber,minha filha?
- Se tem alguem na casa do Gabriel.
- Você nao sabe o que aconteceu? - ela pergunta com uma voz tipica de pessoas mecheriqueiras. Se aproxima um pouco de mim antes de falar novamente. - Ele sofreu um acidente!

Capitulo 5
Entro em choque e sinto como se tivesse recebido um impacto de um caminhao em alta velocidade. Minhas maos suam frio e me dou conta de que estao tremendo tambem. A senhora percebe o meu estado e fala algo. Entendo apenas algumas palavras. Minha mente esta em outro lugar.
- Entre,querida! Parece que vai desmaiar! - ela segura meu braço e me puxa para dentro. Eu que deveria estar apoiando a senhora e nao o contrario. Me sinto dentro de uma piada ironica de mau gosto. Ela aponta para uma cadeira no terraço para que eu me sente e vai buscar um copo d'agua.
Me recuso a pensar em qualquer coisa ate que ela me diga o que aconteceu. Nao demora muito e ela volta,estendendo o copo para mim. O pego com as maos meio tremendo e falo um 'Obriagada' que nao tenho certeza que ela ouviu.
- Filha,nao tem ninguem em casa. Foram todos para o hospital. Eu estava varrendo a calçada quando os vi saindo. Pelo que me disseram ele sofreu um acidente de moto junto com um amigo. Um carro bateu neles quando ultrapassou um sinal. - ouvindo essas ultimas palavras nao deixo de pensar no pior. Ela olha para mim como se esperando que eu pergunte algo e eu o faço.
- O que aconteceu com ele? Foi grave? - pergunto ja nao reconhecendo minha propria voz que diminui a cada palavra. Nem percebo quando as lagrimas começam,mas as sinto descendo em meu rosto.
- Querida,mantenha a calma. Eu nao sei dizer. Eles sairam muito apressados e nao me disseram nada alem disso. Sinto muito! Ele era tao jovem! - ela fala como se ele estivesse morto e ate parece que deseja isso. Mas devo estar enganada, ela so é uma velha senhora que gosta de fofocas.
- A senhora sabe pelo menos me dizer em que hospital ele esta?
- No hospital principal do bairro vizinho. Mas voce vai ate la agora? A essa hora?
- E o que a senhora quer que eu faça? Espere por noticias em casa que nao sei quando vao chegar! Eu nao tenho condiçoes para isso! - falo com mais raiva do que deveria. Ela nao tem culpa de nada. - Me desculpe! Eu ja vou indo. Obrigada de qualquer forma. Ela me acompanha ate a calçada falando tantos 'Sinto muito' que quase desejo que fosse ela no lugar dele. Ela nao parece nem um pouco com pena ou qualquer outra coisa em relaçao a ele. Mas nao vou me rebaixar desejando o mau a ninguem. Ainda mais a uma senhora.
Sinto meus pés pesarem cada vez mais a cada passo. Me arrasto pelas ruas de volta para casa me sentindo uma defunta. Meu eu em cinzas. Eu nao penso em coisas do tipo 'Porque com ele?' ou 'Que vida injusta!'. Nao adiantaria porque nao mudaria nada. Parece apenas que uma parte de mim que agora era cor,uma mistura de todas elas que formavam algo novo. Algo so meu e dele. Uma mistura so nossa. E agora parece estar transparente. Nao,nao transparente,mas cinza. E eu nao sei o que vou fazer se o pior tiver acontecido.
Chego em casa e minha mae esta na cozinha preparando alguma coisa. Olho para a mesa e nao vejo o bilhete mais. Ela deve ter o lido. Nao quero encará-la agora se nao eu teria que falar a ela o que aconteceu e nao quero repartir isso com mais ninguem.
Entro no meu quarto e pego o meu celular para ver as horas. Sao exatamente 21:00 hrs. Nao tem como eu ir ao hospital hoje.
Em pensar que hoje mesmo ele me pediu em namoro. O momento que significou um recomeço na minha vida. E agora nao posso tê-lo comigo.
Imagino ele no hospital em uma UTI esperando pela minha chegada. Se ele estiver mesno vivo. Repito para mim mesma ' ele esta esta esta esta' ate que nao consigo mais distinguir o que estou dizendo.
Me jogo na cama. Quase imediatamente pego no sono e tenho um sonho. Vejo nós dois no futuro sentados no bosque um ao lado do outro. Ele esta bem e nao existe qualquer sinal de que algi aconteceu com ele.
Falamos de coisas que jamais teriamos coragem de confidenciar a alguem.
Contando segredos. Tirando todo o peso acumulado em anos.
Jogando fora toda a  vergonha de ser quem somos.Com um olhar carinhoso e gentil que nao precisa de palavras nossas mãos viajam pela grama atraidas como imãs. Indo imperceptivelmente ao encontro de ambas.
Se juntam,se colam.
Nossos rostos coram e um sorriso passa em nossos labios. E as palavras se vão.
Sinto o nervosismo de antecipaçao ao perceber o que estamos prestes a fazer nesse bosque,embaixo de uma arvore na qual nossos nomes estao gravados com a minha letra e voce ele nao sabe.
Vejo ele me puxar para perto em um movimento forte e gentil e estou sem fôlego.
Meus olhos encontram os dele e vejo meu reflexo assustado neles.
Mas seu rosto esta calmo,com um leve sorriso no canto dos labios. Eu rio tambem.
Agora ele se aproxima,nossos rostos a centimetros de se encontrarem. Sua mao pega de leve em meu rosto e eu sei que estou corando novamente. Em um momento de extase acabo com essa distancia tao pequena entre nós e juntos agora somos um so coraçao.
Acordo no meio da noite ainda com a sensaçao de seus labios nos meus. No escuro guio minha mao ate minha boca, fecho os olhos tentando conter minhas lagrimas. Elas descem descontroladas como pequenas nascentes serpenteando por minhas bochechas. Um som gutural escapal de mim e parece que uma fera quer se libertar do meu corpo. Tento abafar com as maos os meus soluços. Mas desisto e me entrego ao desespero. Parece que a vida me armou um conjunto de ciladas pelo caminho e ao trazer Gabriel para ele acabei o jogando em uma delas. Sei que deve ser loucura,mas me sinto culpada.
Acordo cedo depois de uma noite má durmida. E tambem porque quero sair sem que minha mae veja. Me arrumo e decido ir usando uma roupa que uma vez Gabriel disse que caia muito bem em mim. Uma blusa preta com uma das mangas decidas com uma estampa de caveira e o meu short jeans esfarrapado. Me sinto errada assim, levando um simbolo da morte comigo para o hospital, mas vou assim por ele.
Faço meu proprio cafe. Tomo apressada e pego um biscoito e coloco dentro da bolsa para caso eu va demorar muito. Deixo um bilhete para minha mae dizendo que tive que ir maia cedo a escola hoje por conta de um trabalho. Nao gosto de mentir, mas as vezes é necessario.
Assim que sento em uma cadeira no onibus meu coraçao afunda. Eu nao sei como descrever muito bem o que sinto agora,mas é como a sensacao de estar prestes a apresentar um trabalho sozinho para a turma inteira na escola. Aquela dor no peito,seguida de aceleraçao e um mau estar geral. Multiplique por dez e quem sabe voce tera uma nocao de como estou.
Chego no hospital,e me sinto paralisada. Eu nunca vi visitar alguem aqui. Nao me lembro nem ao menos de eu mesma ter sido trazida para ca. Me sinto estranha e deslocada,mas me obrigo a andar ate a bancada onde dao informacoes.
- Bom dia! Eu gostaria de saber se posso visitar um paciente que deu entrada aqui ontem por causa de um acidente. O nome dele é Gabriel Sousa Carvalho. - a mulher pede para que eu espere enquanto ela checa informacoes no computador a sua frente.
- Temos um paciente com esse nome aqui. Mas ele so pode receber visitas dos familiares. Restricoes medicas. - ela fala de um modo meio ensaiado que me lembra algo como um robô.
- Mas eu sou a namorada dele! Eu preciso muito vê-lo! - falo implorando com uma voz suave para tentar convence-la.
- Desculpe,querida! So obedeço ordens. Voce pode procurar peloa familiares dele ali. - ela aponta para um lugar um pouco afastado onde tem varias cadeiras proximas umas as outras todas ocupadas.
- Ok. Obrigada! - dou um sorriso educado e vou em direcao a ala de espera.
Andar pelo hospital é algo muito estranho para mim. Nao me sinto a vontade no meio de tantas pessoas que sem ter maia o que fazer do que esperar olham para tudo e todos que veem. Logo a visto os pais de Gabriel que estao de costas para mim sentados mais para o canto da aglomeraçao de cadeiras. Eles nao me veem chegar e eu falo:
- Oi,dona Julia! - ela olha para mim junto com seu marido. Olho para ele e meneio com a cabeça em sua direçao e ele me retribui com um sorriso murcho. Eles parecem muito abatidos. E nao é para menos. Fico em pe ao lado da mae de Gabi ja que nao a mais cadeiras disponiveis.
- Oi,Laura! Entao voce ja ficou sabendo?
- Sim,eu fui ate a sua casa ontem a noite e uma vizinha me contou o que aconteceu. - sinto um nó na garganta e continuo. - Como ele esta?
- Nao muito bem. No acidente, ele acabou fraturando uma das pernas e um dos braços, e a bacia. - ela começa a chorar e tenta enxugar as lagrimas. Mas elas sao muito insistentes. - Nos o vimos apenas ontem assim que chegamos. Agora ele esta na UTI esperando para ir para a sala de cirurgias.
Eu tento assimilar o que ela acabou de falar. Ele esta vivo afinal. Mas o caso parece ser muito grave. Ja ouvi falar o que pode acontecer nesses casos. Ele pode ficar paralitico. Lagrimas invadem meu rosto sem permissao.
- É muito grave? - falo.
- Sim. O medico nos disse que ele pode ter tido algum comprometimento da coluna no impacto. O choque foi bem na traseira da moto onde ele estava. Ele pode ficar paralitico. - ela olha para o chao e depois para o marido que a puxa para um abraço. Pelo menos,ela tem quem a reconforte um pouco.
Eu olho para o outro lado da sala e vejo todos os tipos de paciente imaginaveis em macas,no chao,esperando por atendimento. O cheiro de sangue é forte e me sinto um pouco tonta.
- Dona Julia? - ela olha para mim com seus olhos inchados e vermelhos. - Nao estou me sentindo muito bem e como nao posso vê-lo, estou indo para casa. - abro minha bolsa e pego um papel e caneta e escrevo meu telefone e o dou para ela. - Me ligue quando ele for para a sala de cirurgia? Quero estar aqui nessa hora. - ela pega o papel e o dobra.
- Claro,querida! Ele tem sorte de ter uma amiga como voce! - eu rio um pouco. Ele nem teve tempo de falar sobre nosso namoro para sua familia.
- Ate mais!
Me viro em direcao a saida sem saber para onde vou agora.

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