segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

[Eu Cinza] Mais do Capitulo 11

Assim que a noite chega estamos os quatro sentados ao redor da mesa jantando. O silencio paira ao nosso redor, nenhum de nos apressados para que ele se quebre. Depois do abraço acalentador de Jefferson, eu fui andar sozinha para me livrar de mim mesma. Eu sinto como se eu fosse meu pior problema. Eu me deixo me abater muito facil mesmo sabendo o que tem aqui em jogo.
Eu nao sei se fiz mal tendo aquele momento com Jefferson. Ele pareceu tao feliz com nossa subita aproximacao, mas eu ainda nao tenho certeza de nada. Nao quero lhe dar esperanças antes de ter uma conversa definitiva com Gabriel. Nao antes de saber o que se passa com ele. Sem saber se ele ainda me ama e se existe ainda alguma possibilidade de existir 'nós' outra vez. Sinto como se eu tivesse um dever com ele. Talvez essa ligaçao nunca se quebre totalmente. Em algum lugar dentro de mim sei que ele precisa da minha ajuda. Em algum lugar, ele me pede socorro.
Quando termino de comer vou para o terraço. Me encosto em pe em uma das colunas admirando as estrelas. Aqui nesse meio do nada elas parecem mais vivas.
- Olhando as estrelas? - ouço Jefferson falar se aproximando.
- Aqui elas parecem se multiplicar. - digo.
- Aqui nao tem tanto transito e meio que estamos no mato. Entao, nao tem tanta poluiçao para as cobrir. - ele diz com o rosto erguido olhando para o ceu. - É um dos motivos para eu gostar daqui.
- Faz muito tempo que voces estao aqui? - pergunto.
- Ja tem alguns anos. Consegui compra-la por um preço bem menor.  - ele diz me encarando.
- Voce disse que trabalha para se sustentar, mas voce nao tem ido esses dias. Inventou alguma historia?
- Nao. Eu nao precisei. - ele suspira antes de continuar. - Eu tinha ferias atrasadas e vou poder ficar alguns dias sem ir trabalhar. Espero ser o bastante para resolver essa historia.
- Eu tambem. - digo.
- Voce quer dar uma volta comigo? - ele fala me dando um sorriso.
- Eu ja andei duas vezes por esse quarteirao. Nao acho que gostaria de andar por ele novamente. - eu falo dando um leve sorriso para ele.
- Nao falei para andarmos. Venha comigo. - ele fala descendo as escadas indo em direcao a um dos lados da casa. O sigo e assim que viramos vejo uma moto preta que nao tinha percebido antes.
- Ela ja estava aqui? Nao lembro de ter a visto. - falo intrigada.
- Nao. Ela estava em uma oficina aqui perto. Quando voce foi dar aquela volta antes do jantar um cara de la a trouxe. - ele diz ja sentado na moto e a liga. - Quer ou nao dar uma volta comigo?
- Acho que nao tenho nada melhor para fazer mesmo. - falo sentando atras dele meio desageitada. Andei poucas vezes de moto.
- Se encoste mais em mim e segure firme. - ele fala meio brincalhao. - Ja andou de moto antes?
- Ja. A muito tempo atras. - falo um pouco envergonhada.
Seguro firme ao redor de sua cintura e posso sentir seus musculos por cima da camisa. Minhas pernas e meu corpo estao encostados nele tao firmemente que me sinto corar. Parece que estou fazendo algo errado. Ele acelera a moto saindo para a rua. Sinto o vento em meu rosto e a medida que a velocidade aumenta mau consigo abrir meus olhos.
- Va mais devagar. - tento falar alto bastante para que ele me esculte acima do som do vento em seus ouvidos.
- Devagar nao tem graça,gata!  - ele fala alegre e me lembro que ele nao havia me chamado mais de 'gata', o que me parece estranho agora.
- Foi assim que Gabriel ficou paralitico! Andando assim em uma moto. - falo me lembrando do acidente que mudou o rumo de tudo.
- Eu nao sou o Gabriel! - ele fala cuspindo cada palavra, mas desacelera. - Nao me compare a ele.
- Eu nao estou te comparando a ele. Estou apenas te alertando. - falo com raiva quando entramos em uma avenida que ainda nao reconheço.
- Pois me alerte sem usar o nome dele. - ele diz chateado.
- Como voce preferir. - falo emburrada.
Seguimos o restante do caminho sem dar nenhuma palavra. Ja percorremos varios quilometros e acho que ele esta me levando para a praça onde dormimos quando fugimos da casa de Juliana. Consigo reconhecer algumas ruas.
Como eu pensava, ele desliga a moto na praça. Ela esta silenciosa e nao parece ter ninguem por aqui. Eu nao os julgo por que aqui é muito isolado. Desço da moto e me afasto alguns metros de Jefferson que ainda esta sentado na moto. Paro embaixo de um pequeno poste no meio da calçada, daqueles que me lembram tempos antigos. Jefferson vem ao meu encontro e para na minha frente me encarando.
- Eu nao gosto de brigar com voce. - ele fala pousando uma de suas maos em meu ombro.
- As vezes, voce me chateia muito. Parece que tem duas pessoas dentro de voce. - eu digo me afastando e andando em volta dele. - Uma que me causa raiva, que me faz ter vontade de explodir. E, outra... - eu paro, as palavras sumindo.
- Outra? - ele questiona e posso ouvir um tom de satisfacao em sua voz.
- E,outra que me atrai. Mas nao pense que eu gosto de voce. - paro de frente para ele. Ele olha fundo em meus olhos por alguns segundos e me puxa pela cintura ate estarmos colados. Nossos rostos a centimetros de se encontrarem.
- E eu deveria pensar outra coisa? Porque nao é isso o que parece. - enquanto ele fala sinto cheira de menta.
Posso sentir sua respiracao aflita bater no meu rosto. Ele se inclina mais para perto de mim e fecho os meus olhos em antecipaçao. Seus labios encontram os meus de uma maneira leve em um encaixe preciso, mas em poucos segundos ele me pressiona com mais força, sua boca faminta e voraz pela minha. Eu sinto algo que eu nunca antes tinha sentido com alguem. Nem mesmo com Gabriel. Eu me sinto como se eu nao fosse mais eu. Como se eu nao tivesse mais plenos poderes sobre mim. Apenas aquela vontade insaciavel reverberando pelo meu ser e o mesmo parece esta acontecendo com ele.
Ele me puxa nos arrastando para mais perto do poste e se encosta nele. Sua boca viajando pelo meu pescoço, descendo pelo meu ombro. Inclino minha cabeça para tras inconsciente de minhas açoes, apenas consciente do meu desejo. O envolvo com meus braços em seu pescoço, sua boca na minha. Ele se afasta sem folego e diz:
- Eu te quero como eu nunca quis ninguem,Laura. Mais do que voce pode imaginar. - ele fala segurando meu rosto entre suas maos, nossos olhares desesperados para se encontrarem. Ele me abraça forte e posso ouvir o bater acelerado do seu coracao.
- Eu ainda nao posso te dizer que eu gosto verdadeiramente de voce, mas eu sinto que estou perto de chegar la. - falo sinceramente.
- Eu nao poderia esta mais feliz em ouvir isso! Eu estarei sempre do seu lado. Mesmo quando voce achar que eu nao estarei la, eu encontrarei uma maneira. - ele diz e me da um beijo rapido.
- Voce acha que eu vou poder voltar para casa logo? Nao que eu nao goste de esta com voces, mas eu sinto falta de la, de esta perto de algo que me traga a presença dela. - eu falo tristemente e ele faz um carinho em minha bochecha.
- Ainda nao. Mas logo, eu prometo. Nos traremos ela de volta! - ele diz serio. - Eu proprio me encarregarei de dar a Juliana o que ela merece e a quem mais a estiver ajudando. - ele fala transparecendo sua raiva e sinto que ele esta falando de Gabriel.
- É melhor nos voltarmos. Bianca e Leandro podem esta preocupados.
- Voce esta certa. Vamos. - ele fala pegando a minha mao e me levando ate a moto.
Assim que chegamos em casa damos de cara com Bianca e Leandro sentados na sala como se estivessem nos esperando. O que na verdade eles estavam mesmo.
- Amanha, eu e Bianca vamos tentar localizar o Marcelo. - Leandro fala.
- Marcelo? - falo sem entender.
- O Gleam do Gabriel. - Bianca responde. - Vamos amanha bem cedo atras dele. So verificar onde ele esta. Nao vamos falar com ele. Nao agora.
- Eu gostaria de ir junto. - eu falo consciente de que quero muito conhece-lo.
- Nenhum dos dois vai com a gente. - Leandro fala serio. - Nao queremos nos arriscar. Os Damns ainda estao la fora. Podem esta nos procurando e poderiamos chamar muita atencao. Voces ficam aqui.
- Mas, eu quero ve-lo! Se ele pode nos ajudar temos que falar logo com ele. É a vida da minha mae que esta em jogo aqui! Ninguem sabe o que ela pode esta passando! - falo chateada por parecer que eles nao se importam com meus sentimentos.
- Voces nao iram. Nao podemos tomar uma atitude precipitada. Nem sabemos se ele esta em condiçoes de ajudar. - Leandro diz. - Nos sabemos muito bem o que esta em jogo aqui! Por isso mesmo temos que ser cautelosos. Espero que voce entenda.
Eu saio da sala em direcao ao restante da casa. Nao posso acreditar que eles querem me deixar de fora. Provavelmente, eles nao me levaram quando forem falar com ele com medo de que eu estrague tudo. Sem pensar, abro a porta do quarto de Jefferson e me jogo na cama. Afundo meu rosto no travesseiro e sinto cheiro se sabao e menta. Lagrimas começam a escorrer por meu rosto sem permisao. Me sinto inutil sem poder ajudar minha mae. Sem saber ao menos como ela esta. Quando eu penso em tudo isso nao consigo parar de me perguntar por que tudo isso esta acontecendo comigo. Como se eu nao ja tivesse tido problemas para uma vida inteira. Primeiro, um pai bêbado que so fazia de todos os dias, um dia nublado. Depois que ele se foi, uma mae com crises que descontava tudo em cima de mim ate que nos distanciamos. Terceiro, um namorado que me trocou por a pessoa que esta estragando os meus dias e destruindo as unicas coisas boas que eu tive em anos. Agora eu tenho que juntar todos os cacos de mim mesma, me fazer de forte para lutar pelo que me resta de vida.
Sinto uma mao tocar minhas costas, mas nao me viro. Eu preciso ficar sozinha. Quem sabe se eu botar para fora toda a tristeza, ela va embora e eu me torne forte como todos esperam.
- Me deixe sozinha! - eu falo com a voz embargada sabendo que deve ser Jefferson quem esta aqui.
- Eu falei que jamais te deixaria sozinha. - ele fala sentando ao meu lado. Nao me viro para o encarar. - Eu posso entender como voce esta se sentindo.
- Nenhum de voces pode entender. Nenhum de voces viveu a minha vida. - eu falo chateada.
- Eu nao tive uma mae,mas eu posso entender como deve ser ter uma e perdê-la. - ele fala tristeza transparecendo na sua voz. - Laura, seja forte! Eu sei que é dificil, mas ela precisa de voce pronta. Voce tem que esta pronta para agir. Eu estou aqui com voce. - ele diz acariciando meu braço e eu me viro para emcara-lo. Seus olhos estao cheios de dor e amargura. Toco o rosto dele de leve. Ele tem uma maneira de me fazer mudar de ideia como ninguem poderia.
- Eu acho que voce deve ser o unico aqui que pode me entender. - me afasto para perto dele e ele me ajuda a me ajeitar em seu colo, deitada com a cabeça recostada em seu peito. - Porque essas coisas tem que acontecer?
- Eu nao sei,Laura. - ele fala colocando seus braços ao meu redor. - Mas, eu sei que nao estamos sozinhos. Temos Leandro e Bianca conosco. Acredite, eles so querem nosso bem. Sem eles nao poderiamos trazer sua mae de volta.
- Eu so quero esquecer tudo isso por um momento. Deixar tudo do lado de fora. - fecho os meus olhos me sentindo cansada.
- Durma,Laura. Voce esta tao abatida. Eu afastarei seus pesadelos. Eu prometo. - me ergo por um momento olhando fundo em seus olhos. Talvez ele seja tudo que eu preciso agora.
No momento seguinte, so posso dizer que estive em paz como nunca pude esta esses dias. O calor do seu corpo junto ao meu aquece mais do que minha pele. Aquece tambem o meu coracao. Sem perceber durmo com o familiar cheiro de sabao e menta. Sinto que talvez eu nao seja apenas cinza. Agora sou metade cor, metade cinza.

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