domingo, 16 de fevereiro de 2014

[Eu Cinza] Continuação do Capitulo 13

Leandro e Jefferson nos encaram de seus lugares no sofa assim que nos materializamos na sala. Nao consigo encara-los depois de ter dito que Gabriel nos ajudaria. Eu dou as costas para eles e vou em direçao a cozinha. Posso ouvir a voz suave de Bianca lhes informando o fiasco da nossa tentativa e a resposta quase inaudivel de Leandro: Eu sabia...
Paro no meio do que deveria ser o quintal encarando as outras casas silenciosas. Desde que cheguei aqui nao vi nenhuma pessoa andando por entre elas. Nem entrando, nem saindo. Ouvi apenas alguns poucos ruidos a noite, mas apenas isso. De repente, sinto cheiro de sabonete e menta trazido pela brisa. Jefferson me abraça por traz e eu nem sequer me assusto. Vai demorar muito para que algo desafie minha perspectiva de medo novamente, penso. Ficamos assim, aproveitando o calor um do outro por alguns minutos em silencio ate que eu o quebro:
- Onde estao as pessoas daqui? - pergunto.
- Elas trabalham a maior parte do dia ou simplesmente perambulam por ai. Sao todos pobres.
- E as crianças? Nao a crianças aqui?
- Nao. Nao sei o motivo, mas a maioria das pessoas que moram aqui sao solteiras.
- Deve ser por que aqui é quase o fim do mundo.
Ele ri por um momento e aquela risada me parece estranha nesse momento. Deslocada, totalmente fora do lugar. Me viro para encara-lo e coloco minhas maos em sua cintura.
- Voce nao vai me dizer eu te avisei? - pergunto. As palavras saem tristes.
- Nao. Porque eu faria isso? Eu tambem tinha um pouco de esperança depois de toda aquela sua descriçao sobre ele, mas vejo que eu estava certo afinal.
- Bianca contou toda a nossa conversa?
- Alguns pedaços dela. Ele foi muito injusto com voce e com a sua mae. Tenho vontade de ir ate ele e quebrar-lhe a cara! Ele poderia ter te avisado. Se nao fosse por amor, mas pela amizade que voces tiveram.- ele fala meio raivoso.
- Eu nao quero mais pensar nele. - solto um longo suspiro. - Eu irei falar com Marcelo e voce ira comigo.
- Mas, se ele nao ouviu voces da outra vez, quem dira que ele ouvira agora?
- É a minha ultima esperança. Nao temos nenhuma pista do Quest. Nenhuma. E so ele parece saber de alguma coisa.
- E se ele nao souber,Laura? Ou se ele nao quiser falar?
- Ele vai falar. Nao posso me dar o luxo de pensar o contrario agora. Se ele nao souber, ele ainda podera nos ajudar a vasculhar a cidade. Cada centimetro dela se for preciso. Eu tenho que trazer minha mae de volta!
- Nos iremos. Eu irei com voce. Trarei ele arrastado se for preciso!
Ele me abraça forte e aspiro seu cheiro com toda a minha força. Nao quero esquecer disso nunca. Ele me traz segurança, como se eu finalmente estivesse no lugar certo. Como se eu nao precisasse jamais voltar aquele bosque novamente para ficar sozinha. Me afasto e puxo seu rosto para mais perto. Nos beijamos com intensidade, vorazes. Seus labios se encaixam nas dobras dos meus com um afago caloroso e protetor e por um breve momento eu esqueço dos problemas. Esqueço do meu proprio ser como se fossemos duas almas nos unindo sem nos importarmos com os defeitos um do outro.
Ele me afasta para olhar em meus olhos e me da um beijo na testa. Seguro suas maos entre as minhas entrelaçando nossos dedos. Ele me da o seu sorriso de propaganda de pasta de dentes e o retribuo. Depois que tudo isso passar nos poderemos aproveitar a companhia um do outro mais intensamente. Isso se um dia isso passar. Ele coloca um cacho do meu cabelo atras da minha orelha e fala:
- Esta com fome?
- Agora que voce falou... me sinto faminta!
Seguro sua mao firmemente enquanto ele me leva para dentro.
Jefferson tem uma leveza, algo que consegue me acalmar inteiramente. Diferente de como Gabriel me fazia sentir. Eu sempre ficava com duvidas quando estava com ele e nunca senti vontade de nao ir mais ao Bosque. Agora com Jefferson é o oposto. Ele me da segurança o bastante para que eu nao precise de nada alem de ser eu mesma. Ele me coloca para cima de uma maneira que ninguem jamais conseguiu fazer. Sinto como se finalmente eu estivesse liberta dos meus medos. Aqui é o meu lugar. Nao estou mais desencaixada da vida.
Ele me pega olhando-o enquanto mordisco meu sanduiche e ri. Se nao fosse pela situacao em que minha mae foi colocada eu poderia esta usufruindo dessa felicidade por completo. Sem medos ou ansiedade. Pego sua mao livre entre as minhas e aperto forte e sorrio para ele.
- Voce me faz muito bem, sabia? - falo.
- E ainda farei muito mais. Voce sim me faz sentir otimo! Como se eu fosse um passaro recem saido da gaiola.
- Eu penso o mesmo em relacao a voce.
Ele me puxa para um abraço desajeitado de lado e planta um beijo suave nos meus labios com gosto de menta. Estamos sentados no terraço lado a lado olhando o sol descer por entre as arvores indo em direcao a linha do infinito. É a primeira vez que eu divido um momento dessa forma com alguem. Apoio minha cabeça no ombro dele e ele me envolve com um dos braços. Apesar do braço da cadeira esta machucando levemente minha costela me forço a suportar para esta o mais perto dele possivel. Ele é como se fosse a minha ancora de salvacao e sinto que represento o mesmo para ele.
- Nos vamos traze-la de volta. Eu prometo a voce,Laura. Eu tenho certeza disso.
- Faremos o possivel. E mesmo que... - as palavras parecem nao querer sair. - ...nao consigamos traze-la tenho certeza que teremos feito o nosso maximo.
- Nao pense nisso. Nos vamos conseguir! Eu me recuso a perder. Pela primeira vez na minha vida, eu quero sair dessa por cima. Nos podemos fazer o nosso destino.
- Eu espero que sim.
- Tenha certeza. Nos temos anjos, nao temos? Isso so pode querer dizer que Deus esta do nosso lado. Somos especiais!
- Muito especiais. - rio e o puxo para mais um dos nossos beijos exagerados e apaixonados. O por do sol fazendo de nossas peles um espelho alaranjado e eu so quero aproveitar cada segundo que eu tiver ao lado dele.
- Voce deve ir descansar,Laura! Voce passou muito tempo fora hoje. - ele fala me afastando. - Alem da dobra de viagem que Bianca fez para trazer voces de volta.
- Tudo bem. Voce vem comigo?
- Nao. Eu preciso resolver um assunto, mas nao se preoculpe. Estarei la quando voce menos esperar.
Ja no quarto me deito e sinto cada um dos meus musculos doerem em reprovacao. A um minuto eu nao estava sentindo nada. Agora que resolvo me deitar voces reclamam? Ouço Jefferson acelerar a moto e partir o que desfaz meus pensamentos. Nao imagino o que possa ser o assunto que ele tem para resolver. O cansaço acaba me vencendo e as garras do sono me arrastam pela escuridao. Eu acabo sendo levada para mais uma visao noturna. Estou no mesmo cubiculo escuro e umido de antes. O comodo onde minha mae esta encerrada. A unica claridade que entra no quarto onde estou é a das lampadas no corredor. Sigo por ele e paro perto de entrar no proximo espaço quando ouço vozes. Demora um pouco para que possa enxerga-los com a pouca claridade que vai do corredor ate eles, mas vejo dois Damns conversando de pe  proxima a mesa de costas para mim. Mesmo sabendo que eles nao podem me ver ou me tocar como na outra visao que eu nao pude tocar ou me comunicar com minha mae, tenho medo que eles possam me sentir bisbilhotando-os. Dou um passo para mais perto da entrada do comodo e posso distinguir o que dizem:
- Voce acha que eles podem encontrar uma maneira de entrar aqui? - o mais baixo pergunta.
- Nao. Eles nem ao menos sabem quem ele é. - ele da uma gargalhada aterrorizante. - Tolos! Bem na frente de seus narizes, mas nao percebem. Isso so facilita ainda mais os nossos planos!
- Entao nao temos com o que nos preocupar. Nao é mesmo?
- Claro, seu cabeça oca! Nao esta me ouvindo? Eles nunca entrarao aqui. Estao cegos. E mesmo que entrassem, estamos preparados para eles.
- Mas e a mulher? Ela esta muito fraca. O que a fedelha mandou fazer com ela? - com fedelha pressinto que falam de Juliana.
- Ela vai aguentar. Tem que aguentar por que a fedelha quer aquela garota do nosso lado. Na verdade, acho que aquele garoto da cadeira de rodas esta fazendo a cabeça da fedelha.
- Ela é tao trouxa quanto aqueles outros! - ele para de falar por um segundo parecendo esta pensando. - Mas, e se eles o encontrarem? E se ela descobrir?
- Nos os mataremos! Os dois! E depois de conseguirmos o que queremos cuidaremos da fedelha tambem! Do jeito que ela merece.
Eles riem juntos de um jeito que faria qualquer ser humano ter um ataque histerico e fugir da presença deles. Reunindo minha ultima centelha de coragem vou para a porta de acesso ao proximo comodo. Antes de entrar dou uma ultima espiada por sobre o ombro e os vejo de costas olhando para alguma coisa na tela de um computador, mas estou muito distante para conseguir ver o que é.
Passo meu corpo pela porta e a unica claridade no quarto vem dos aparelhos do lado da cama onde minha mae esta. Demora alguns segundos para que meus olhos se acostumem ao breu. Paro do lado da cama e uma serie de aparelhos que piscam com luzinhas vermelhas e verdes dao um tom fantasmagorico ao ambiente. Me aproximo da cama e vejo o rosto dela que esta verde por conta das luzinhas dos aparelhos. Ela esta embrulhada ate os ombros com a cabeça pendendo um pouco para o meu lado. Seu rosto esta um pouco mais magro do que da outra vez. Nao so o rosto como seu corpo inteiro. Ela parece fragil e inspira cuidados que aqui ela nao pode ter. Apesar de parecer adormecida, olheiras negras circulam seus olhos fundos. Olho para as maquinas ao seu lado. Varios fios vao delas para os braços da minha mae. So consigo identificar um monitor cardiaco e pelo sinal em verde que vejo na tela seu batimento cardiaco parace fraco. Vejo tambem um soro conectado ao seu braço. Eles estao mantendo-a viva por algum motivo, mas qual? Nao faz sentido. Talvez seja uma armadilha para nos pegar , como uma isca.
Ainda assim, esse nao parece ser o unico motivo e sinto que so irei descobrir o que esta acontecendo quando acharmos o Quest. No final, tudo parece esta ligado a ele de alguma maneira.
De repente, sinto uma força invisivel me puxar indicando que meu tempo aqui acabou. Olho para minha mae por uma ultima vez antes de deixa-la novamente. Quando levo minha mao para tentar toca-la meus olhos se abrem para a realidade.

Nenhum comentário:

Postar um comentário