segunda-feira, 7 de julho de 2014

[Book 2] [Overrun: Sombras Ocultas] Capitulo 1

  



 Para aqueles que por mais que  a vida lhe retire coisas  permanecem inabalados.
   "Os meus fantasmas, mesmo que vivessem apenas dentro da minha mente, eram tão palpavéis quanto algo físico jamais poderá ser."





Minha respiração está tão pesada quanto o meu corpo que parece está sendo transformado em chumbo a medida que fico parada nesse lugar. As sombras a minha frente pararam no lugar tão próximas uma a outra que é difícil distinguí-las. Poderia ser algo criado pela nevoa tao espessa, mas os murmurios vindos daquele ponto nao me deixam enganar. Olho rapidamente para meus companheiros as minhas costas dormindo profundamente. Nao sei se por cansaço ou por que o frio ja fez dos seus músculos como pedras de gelo. Desconfio que as duas coisas. Decido nao chama-los para nao avisar as sombras a minha localizacao. Elas parecem nao ter me notado ainda. Sei que no estado em que estou seria facil para elas me jogarem da ponte ou me matarem aqui mesmo com algum metodo rapido ou em uma carnificina. Me sinto como uma arvore seca no meio da neve. Congelando sem poder sair do lugar. Esperando pelo perigo que me espreita.
As silhuetas começam a andar vagarosamente em minha direcao parecendo perdidas. Talvez elas nao sejam deste lugar. Quem sabe sao pacificas? Alguem para nos ajudar a escapar desse lugar? Mas a cada passo que elas dão ate mim meu coracao afunda ainda mais. Algo me diz que nao devo confiar em minhas esperancas. Nao depois do que vi em Konden. Uma das sombras é mais alta que a outra e parece ter a forma de uma mulher assim como a mais baixa que nao deve ser mais alta do que eu. Levanto a espada assim que percebo que a qualquer momento elas irao me notar. A primeira face que vejo é a da mulher mais alta. Um rosto serio e feroz. Ela estava olhando para o outro lado, mas me percebeu tal qual faria uma onça recem saida de uma moita. Seus olhos dourados borbulhando em perplexidade quando encontraram os meus. Algo me diz que ela nao esperava me ver aqui. A mais baixa olha para a alta intrigada ate que segue o olhar da mesma e me encontra parada observando-as com a espada ligeiramente erguida. Tambem nao tenho em meu rosto uma expressao convidativa. Penso em dizer algo, mas meus labios estao tao ressecados e rigidos que me parece impossivel. Resolvo esperar que elas se manifestem.
A garota e a mulher se olham pelo canto dos olhos parecendo assustadas o que me faz ficar curiosa. Abaixo a espada e elas acompanham meu movimento. A mulher vem ate mim estudando minha expressao a cada passo que ela da como so um animal faria. Ela tem a pele fortemente bronzeada; magra, mas com os musculos torneados; um rosto feroz e angular; o cabelo castanho escuro arrumado em um rabo de cavalo. Esta usando um vestido gasto marrom com um corte antigo com varias aberturas na saia que vai ate o joelho. Parece propria para dar flexibilidade durante uma luta. Ela para a poucos metros de mim e so agora percebo a imensa lança que ela carrega em uma das maos. A mulher passa a lingua ligeiramente sobre os labios ressequidos e ergue uma mao para mim.
- Olá! Sou Diana, a acompanhante da Overrun que esta logo ali atras. Creio que voce tambem seja uma ou nao estaria viva nesta ponte.
Observo a mao estendida pairando no ar a minha frente. Estico a minha forçadamente e a aperto em um cumprrimento. Passo a lingue desajeitamente sobre meus proprios labios seguindo o exemplo de Diana antes de responder.
- Sim, eu sou. Mas o que voces duas fazem aqui?
- Anandi, querida. Pode se aproximar. - ela diz fazendo um gesto para a garota parada a alguns metros ignorando a minha pergunta. - Encontramos a Overrun da sua lenda!
A garota se aproxima parecendo confiante agora que a sua acompanhante a avisou que nao sou uma ameaça. Ela tem a pele levemente brozeada e seu rosto me faz lembrar de alguma coisa que vi na tv. Seu cabelo é da mesma cor do cabelo da mulher, mas ele cai em cascatas ondulantes por suas costas. Ela usa um vestido requintado vermelho cheio de formas e desenhos e parece ser um traje de luta. Entao, percebo porque acho que ja a vi em algum lugar assim que ela começa a falar. Ela é indiana.
- Grande coisa termos encontrado esta garota, Diana. Voce sabe o que penso sobre isso.
Me assusto quando vejo que consigo entender as palavras dela facilmente como se estivesse falando na minha lingua. O sotaque esta la muito nitido. Duas vozes se fundindo. Quase posso diferenciar uma lingua da outra quando faço um esforço.
- Eu consigo te entender. - falo em um murmurio e ela me da um olhar de desprezo.
- Como voce pensou que os Overruns conseguiriam se comunicar se nao se entendessem?
- Porque parece que voce esta sendo hostil comigo?
Ela segura o olhar sobre mim tao forte e penetrante como se olhasse para um inimigo antes de declarar guerra.
- Nao me pergunte algo com o qual voce nao possa lidar depois. O que importa agora é que devemos seguir caminho. Acredito que voce tenha alguma informacao que nos valha alguma coisa ou estou errada?
- Anandi! Deixe de ser arrogante com a garota. - ralha Diana que da um olhar raivoso para a garota seguido de um empurrao. Ela rola os olhos e se volta para mim. - Quem sao aqueles que parecem ja terem partido a algum tempo pelo modo como nao se movem?
Olho para trás confusa por um momento ate perceber que ela estava se referindo a Marcelo e Jefferson.
- Sao meus companheiros. - digo enquanto me afasto ate eles.
Me abaixo e cutuco Marcelo e Jeffferson para que acordem, mas eles apenas permanecem imoveis. Sacudo um de cada vez, mas tambem nao surte nenhum efeito. Diana se ajoelha ao meu lado e coloca uma das maos no peito de Marcelo e o ar parece ondular ao redor do ponto em que ela toca.
- Estou aquecendo ele. Nao se preocupe. - ela diz nao se dando ao trabalho de olhar para mim.
As palpebras de Marcelo lutam para se abrir ate que vejo seus olhos azuis cansados encarando o vazio. Diana se ergue e vai ate Jefferson enquanto ajudo Marcelo a se levantar.
- O que aconteceu? - ele pergunta atordoado.
- Digamos que voces estavam prestes a darem vida ao conto da bela adormecida. - ele me olha perplexo ate que lembro que ele é um anjo. - Agora esta tudo bem.
Ele encara sem entender Anandi que esta com os braços cruzados e a cara amarrada observando Diana reanimando Jefferson.
- Quem sao elas?
- A garota é uma Overrun e a mulher voce ja deve imaginar.
- Nao pensei que encontrariamos um Overrun agora.
- Mas parece que era o melhor momento.
Jefferson se levanta em um sobressalto quase caindo da ponte antes que Diana o segurasse. Mesmo um pouco letargico ele consegue se desvencilhar dela e abre suas asas em maneira defensiva. Diana leva um susto quando as vê e se afasta dele depressa indo para perto de Anandi e seu rosto se contorce de maneira ainda mais feroz.
- Voces se aliaram a um Ronái? Não sabem que eles sao traidores? - Diana diz apontando para Jefferson enquanto cospe as palavras.
Me aproximo dela com os braços ligeiramente abertos para que ela nao o ataque e me coloco entre eles.
- Nao é isso. Me esculte.
- Voce tem dois minutos para me explicar isso ou estamos fora. - ela diz enquanto lança o dedo para mim.
- Ele é meu namorado e é humano. Nos fugimos de Konden e um dos guardioes de la o transformou em um deles para nos ajudar na fulga e na nossa jornada.
- Como voce arrasta um humano qualquer para essa jornada?!
- Ele nao é um qualquer. Ele tem um anjo ou melhor tinha. Ele teve que ficar para tras.
- Ainda nao consegui engolir essa sua historia, mas por hora basta. Precisamos continuar o nosso caminho.
Ela começa a andar a frente puxando uma Anandi confusa atras de si. Ela empunha com força a lança e nos da um olhar raivoso e se volta para frente e continua andado a passos rapidos.
- Eiii! - grito enquanto corro para alcança-la. - Voces nao nos contaran de onde vieram ou como chegaram aqui. Nao sabemos nada sobre voces.
Diana para abruptamente e a nevoa parece ficar mais espessa ao seu redor como se quisesse esconde-la.
- Nao é hora para isso, garota. Nos tambem sabemos muito pouco sobre voces. - ela para de falar parecendo lembrar de alguma coisa. - Eu nao sei o seu nome e nem os deles.
- Laura. Meu nome é Laura.
Antes que eu possa continuar ela some encoberta pela nevoa. Me viro perplexa para encarar dois rostos tao confusos quanto os meus.
- Quem sao elas? - Jefferson pergunta e eu quase respondo que tambem gostaria de saber.
                              +++
Depois de contar tudo o que aconteceu para os dois enquanto eles dormiam, decidimos ir atras delas ja que sao parte importante da minha lenda. As coisas poderiam piorar se nao estivermoa todos juntos. Começamos a andar lado a lado com nossas armas empunhadas procurando por qualquer sinal delas. Se passaram alguns minutos desde que elas sairam e nao daria para elas terem desaparecido tao rapido.
- Onde elas estao? - a pergunta sai sem que eu perceba.
- Ja deveriamos ter topado com elas. - Jefferson responde.
Continuamos andando tentando enxergar atraves da camada de nevoa que parece ficar mais densa a cada passo. Enquanto estou pensando se essa ponte tem um tamanhi infinito um som me chama a atencao. Parecem vozes, mas estao distantes e retorcidas.
- Voces estao escultando? - indaga Marcelo.
Paramos e tentamos ouvir melhor. Caminho alguns metros a frente e o ruido parece diminuir. Quando volto para junto dos outros, ele fica mais intenso. Jefferson abre as asas e voa para cima se perdendo na nevoa. O som nao parece vir de cima, nem fe algum lugar a frente ou atras. Parece que estamos em...
- É embaixo da ponte! - grito.
Jefferson volta das sombras quando ouve a minha voz.
- O que voce disse?
- O som esta vindo de debaixo da ponte. Voce precisa ver o que é.
- Tudo bem.
Ele saca a espada e se lança da beira da ponte. Me agacho na beirada com Marcelo ao meu lado e olho para baixo. Apenas escuridao e mais nevoa. Nao imagino o que pode estar produzindo esse som. Pode ser mais alguns Kenjins, mas eles prometeram que nosso caminho seria pacifico depois do sacrificio de Konoch. Talvez, ela tenha escapado e eles pensam que ela esta conosco. Mesmo com o medo me perseguindo nao consigo deixar de ficar feliz com a pequena esperança. Um brilho me chama a atencao vindo da nevoa, mas entao percebo que é o capacete de Jefferson. Ele paira a nossa frente enquanto luta para recuperar o folego e me assusto.
- O que é que esta la embaixo?
Ele demora alguns segundos para responder.
- Sao elas. Estao presas e penduradas em uma armadilha la embaixo. O ar é praticamente toxico lá. Pouco oxigenio. Nao consegui solta-las.
- Como elas foram parar la embaixo? - pegunto perplexa.
- Uma corda laçou as pernas delas e as puxou para baixo e se trançou sozinha.
- Os Kenjins disseram que nos deixariam em paz!
- Mas isso nao quer dizer que nao terao armadilhas no caminho. - constata Marcelo.
- O que vamos fazer?
Minha pergunta enche o lugar enquanto ouço os murmurios ficando mais freneticos, mais deseaperados. Se nao ajudarmos elas vao morrer asfixiadas. Nao posso fazer nada por elas e me sinto impotente. Jefferson tambem nao conseguiria sozinho.
- Marcelo, voce nao consegue ajudar Jefferson a puxar a corda para cima? Voce pode voar.
Ele me da um olhar triste e amargurado antes de responder.
- Meus poderes estao neutros aqui. Nao consigo.
- Voce tem que tentar! - grito desesperada. - Por favor, tente.
Aperto o ombro dele e olho profundamente em seus olhos azuis, mas ele desvia o olhar para a escuridao.
- O tempo delas esta acabando. - Jefferson murmura.
Marcelo sobe no fino e baixo parapeito da ponte e encara o abismo. Ele faz o impensavel. Se lança para ele. Me engasgo e levo a mao instintivamente a boca contendo um grito enquanto vejo o corpo dele descer esticado para baixo a uma velocidade inumana. Quando Jefferson se lança atras dele vejo o corpo parando no ar. E voltando. Deixo o ar escapar dos meus pulmoes e vejo os dois levitando juntos em direcao a corda. Eles desaparecem embaixo da ponte e fico nervosa por nao pode-los ver. O unico som que ouço é o das asas cortando o ar. Os murmurios pararam e me vejo fazendo uma pequena oracao para que elas nao tenham morrido la embaixo. Nao quando eles estao tao perto de conseguir.
Varios minutos inquietantes se passam ate que eu veja alguma coisa atraves da nevoa. Primeiro vejo la no fundo uma sombra escura surgindo. Forço meus olhos ate que percebo a rede e duas formas dentro dela. Pela velocidade que a corda esta sendo puxada percebo que eles estao com muita dificuldade para suportar o peso delas. Quando estao na metade do caminho a corda desliza alguns metros para baixo e meu coracao afunda. Me concentro na rede e percebo que elas na se mechem la dentro. Devem ter desmaiado. Ou pior.
Sinto tremores percorrerem meu corpo e decido me levantar e ficar em movimento para nao congelar. Assim que fico de pe vejo as cabeças de Jefferson e Marcelo surgindo. Eles estao tao suados mesmo que pareça impossivel tal coisa com essa temperatura. Assim que eles aterrisam na ponte corro para ajuda-los a puxar a corda. Meus musculos doem assim que começo a esforça-los para puxarem o peso que parece muito grande como se alguem estivesse puxando a coisa toda para baixo. Algo aqui nao quer essas duas vivas ou qualquer um de nós. Depois de mais algum esforço o topo da rede surge pela beirada e Marcelo solta a corda me deixando com Jefferson para suportar o peso enquanto ele reboca as duas com a rede para a ponte.
Chegamos todos perto delas e pego minha espada para cortar as cordas. Assim que a lamina toca os fios eles chiam e se desfazem diante dos nossos olhos. Depois que a corda solta o corpo das duas, ela se atira para o abismo. Balanço minha cabeça para fugir da perplexidade e tento acordar Diana com tapinhas. Seu corpo esta gelado, os labios roxos, mas ela esta respirando. Marcelo esta tentando reanimar Anandi que esta em um estado pior que a outra. Quando percebo que nao estamos tendo progresso falo a unica coisa que me vem a cabeça.
- Para acordar voces a Diana usou algum poder para esquentar os corpos de voces. Acho que voce poderia tentar isso.
Marcelo me olha por um instante e volta o rosto para Anandi enquanto considera as minhas palavras.
- Isso se chama Transferencia de Essencia. Posso tentar.
Ele coloca a mao um pouco acima do peito de Anandi, proximo ao pescoço. Por alguns segundos nada acontece ate que o ar começa a ondular fracamente no ponto em que ele esta apoiado.
- Vai demorar um pouco. Laura, deixe Jefferson ficar ao lado de Diana e venha para cá. Ele pode tentar o mesmo que estou fazendo.
Assinto com a cabeça enquanto me levanto e me agacho ao lado de Marcelo. Por sobre o ombro, olho para Jefferson que esta com o olhar serio tentando fazer o poder fluir. As asas se abrem as suas costas tao compridas e expledindas. Elas brilham como um pedaço de diamante colocado sobre o sol. Cores ondulando por todos os lados. Ele apoia a mao sobre Diana tao fora disso tudo, tao concentrado em salva-la e lembro por que eu gosto tanto dele. Ele sempre tenta ser melhor. Nao melhor do que os outros, mas tentando se superar sempre. Percebo que faz tempo que tivemos um tempo para nos. Para conversarmos como um casal normal. Suspiro. Talvez demore para que a normalidade nos encontre de novo. Desvio meu olhar para o corpo de Diana e vejo que eles esta conseguindo esquenta-la. A cor da pele ja esta voltando ao normal e a respiracao parece menos pesada. Me volto para Anandi e percebo que a qualquer momento ela irá acordar. E provavelmente dizendo algo sarcastico para mim. Rolo os meus olhos e me ergo me distanciando um pouco dela e me aproximando de Jefferson. Levo minha mao para tocar suas asas assim que ele retira a mao de Diana. Entao, algo acontece com ele.

Nenhum comentário:

Postar um comentário