sábado, 26 de julho de 2014

[Belnegro] Capítulo 7

Um grande salão se abre para nós assim que entramos na Universidade. O piso é de mármore de um tom creme, e há algumas pilares nas extremidades do recinto. Ao fundo a um palco em formato de meio círculo onde várias pessoas estão sentadas incluindo a diretora e a presidente. Estimo que o ambiente possa abrigar 1000 pessoas. Os 400 estudantes espalhados pelo local ocupam quase a metade. Lucia e eu estamos ha duas filas de distância do palco e temos uma visão privilegiada. Eles esperam que todos entrem, e se acomodem antes de dar início a cerimônia. Apesar de estar em um lugar apertado e cercada por inumeras pessoas, me sinto relativamente calma. Estou mais curiosa do qur nervosa. Observo a diretora em uma conversa contida com Holtz e, novamente, juro que ela olha para mim tentando desfarçar.
Quando todos já entraram, Eleanor se levanta e o silêncio reverbera ao nosso redor. Ela vai até o centro do palco e nos encara antes de falar com sua voz grossa:
- Bom dia, Alunos Padrão! Hoje inicíamos a 40° Cerimônia de Apresentação da II Universidade e Corpo de Funcionários do Estado A. - ela retira o microfone do pedestal e anda para um pouco mais a frente. - Primeiro, parabenizo cada um de vocês pelo esforço e foco para seguir os seu sonhos. Vocês são dignos das profissões para as quais foram escolhidos para serem instruídos para futuramente nos dar resultados positivos em nosso país. Vocês serão a base da nossa sociedade.
- Somos nós, que um dia fomos Alunos Padrão, que lutamos pelos direitos dos cidadãos de nossos estados. Nós os representamos frente ao nosso país. Somos símbolos de uma nação mais forte e inovadora.
- Esperamos que cada um de vocês exerçam seus papéis com integridade, inteligência, humildade e sempre visando o bem comum e as leis. - ela vai em direção a presidente que já está posicionada esperando a deixa para seu discurso. - Agora, passo a palavra para a nossa estimada Presidente Holtz!
Uma salva de palmas explode no recinto.
- Bom dia, alunos. - diz em um tom aveludado. - Há 40 anos atrás, eu estava sozinha no meu gabinete pensando em como faria para melhorar o sistema de integração dos cidadãos após os confrontos que abalaram o país. Eu pensei muito, e percebi que o melhor seria colocar apenas nas mãos dos mais aptos o poder de mudar vidas. - ela se achaava apta a mudar a vida de todo o país, penso. - Porque é isso que vocês farão em suas profissões padrao. Irão lidar com vidas e não muda-las é algo inevitável. Por isso, apenas os mais hábeis chegam até aqui.
- Isso não quer dizer que todos nós não tenhamos ótimas oportunidades. Todos temos aquelas que somos capazes de levar adiante.
- A escolha que vocês fizeram não tem volta. Acredito que cada um de nós foi criado para fazer algo único. Nesse caso, somos contidos em uma única tarefa. Vocês darão suas vidas em prol de outros, e isso é a melhor maneira de transformar nossos dias em algo realmente proveitoso.
- Desejo sorte a cada um de vocês. Que saibam lidar com as dificuldades, usar com inteligência as oportunidades,e manter-se sempre dentro de seus limites. Lembrem-se: a prática da lei molda o cidadão a favor da paz.
Mais uma longa salva de palmas. As palavras da presidente sempre me deixam com um grande "E se...?" em minhas mãos. Quase me deixo enganar. Quase. Ela volta a se sentar em sua cadeira passando a palavra novamente a diretora.
- Para apresentar o corpo de funcionários da Universidade, chamo ao palco Pedro Furtado, Comandante da Brigada Policial de Seguranca da Universidade.
Mais palmas enquanto ele se dirige a frente. Ele é um homem de 28 anos, cabelos pretos e lisos cortados em estilo normal, pele branca, bem apessoado e de semblante amável apesar da profissão. Tento encarar qualquer ponto no palco que nao seja ele.
- Bom dia. Desejo meus parabéns a cada um de vocês. - ele olha para as pessoas sentadas no fundo do palco. - Chamo ao centro do palco os principais funcionários da Universidade. Rodrigo Amorim, Tenente da Seção C; Laura Gonzales, Sub-Tenente da Seção C; Policial Wellington, Policial de Esquemas Táticos do Esquadrão de Defesa, e Bryan Botelho, professor padrão de Defesa Pessoal.
Meus olhos viajam diretamente para o soldado Wellington que está com sua vestimenta de Policial de Operações Táticas. Ele está... está fabuloso. Nao sei como nao surtei ainda olhando por tanto tempo para ele. Pedro retoma a palavra.
- Todos eles lidarão diretamente com vocês. Seja durante aulas, nos corredores tirando dúvidas ou caso sejam chamados para uma conversa particular. - Um grande  hummmm interrompe o comandante. - Não é isso que vocês estão imaginando. (risos) Estou falando de conversas sobre seus desenvolvimentos nos estágios ou coisas similares.
Ele fica sério novamente e retorna a falar.
- A Universidade é dividida em 4 seções separadas entre si. Cada uma delas cuidará futuramente das investigações envolvendo certos estados. Todos sabemos que nossa universidade é ligada a área Investigativa-Policial. Aqui formamos advogados, policiais da PFAC e FIPAS, assim como das suas sub-divisões, peritos criminais, e as demais profissões da área. Então, cada uma dessas seções são divididas de acordo com as profissões. Estamos agora no Hall de entrada da seção C. Aqui são formados os policiais da PFAC e FIPAS, e suas sub-divisões. No final, desta palestra, cada um dos estudantes que não forem dessa seção, serão escoltados a uma visita rápida até a sua seção e depois para seus dormitórios.
Eleanor reaparece enquanto ele volta a seu assento.
- Obrigada, Comandante Furtado. Agora, tenho algumas notícias para dar a vocês. Hoje e amanhã teremos uma folga para um pequeno tur pelas seções e pela cidade. Suas secretarias lhes darão as informações adjacentes de que precisem.
- Mais uma vez, parabéns a todos. Suas secretárias lhes levaráo para seus dormitórios. E, nos vemos amanhã!
Uma confusão começa entre as pessoas que não sabem se saem ou se ficam para esperar para irem ver suas seções. Vários soldados aparecem e começam a dividir os alunos e levá-los pela porta de saída. Como sou do C sigo Lucia para o lado de fora. Enquanto meus pés deslizam pela mármore, minha mente pensa em outra coisa. O Soldado Wellington ou Policial Wellington, já não sei mais o que ele é, poderá trabalhar comigo futuramente. Talvez eu vire sua chefe. Essa perspectiva de vê-lo e trabalhar com ele faz meu coração acelerar, e não sei bem o porque. Balanço a cabeça com receio desses pensamentos quando uma mão firme segura meu braço me puxando para trás. Perco o fôlego. Um homem fardado com a roupa preta da policia tática da FIPAS me da um sorriso irresistível. Antes mesmo de olhar para o nome gravado em seu peito sei de quem se trata. Olho para trás e encaro Lucia que parece confusa.
- Preciso conversar com a senhorita Alice. - ele diz com uma voz profissional. - Pode deixar que a levo para o condomínio logo em seguida.
Pega de surpresa, Lucia apenas faz que sim com a cabeça e nos deixa a sós. Os outros alunos sairam. O palco, a vários metros de distância, está vazio. Olho nos olhos cor de mel do policial Wellington, e estou perdida. So consigo imaginar que deveria estar surtando. Estamos muito perto um do outro... Nem tenho a consciência de perguntar o que ele quer. Mas ele toma a palavra de qualquer maneira.
- Senhorita Alice. - só assimilo aquele sorriso cheio de dentes brancos. - Me desculpe por impedi-la de ir descansar. Imagino que esteja cansada da viagem, mas precisava falar com você.
- Sobre o que exatamente, soldado Wellington? - levanto uma sombrancelha inquisitiva para ele enquanto digo a frase, dando ênfase a palavra soldado.
- Aqui sou um policial. Mas, pode me chamar apenas de Wellington. Eu so queria dizer que vamos trabalhar juntos. Provavelmente, você será minha auxiliar.
- Sua auxiliar? Mas você não é um policial chefe da área investigativa da FIPAS.
Digo discrente. Não fazia sentido.
- Mais tarde posso passar no seu quarto para podermos falar mais a vontade?
- Isso não é proibido?
- Só se fossemos fazer certas coisas.
Sorrimos sem jeito.
- Você não pode nem ao menos me dar uma pista sobre isso? Não compreendo o que você quis dizer.
- Mais tarde. Tenha paciência. - ele me oferece o braço. - Vamos?
Geralmente, sentia repulsa so de pensar em encostar em um homem. Mas, Wellington parece um cara amigavel.
- Tudo bem. - suspiro enlaçando meu braço ao dele. - Mas você irá responder todas as minhas perguntas.
- Na hora certa, sim. Qualquer coisa.
Sinto algo a mais naquelas palavras, mas não sei se quero entendê-las. Afinal, eu vim até aqui para trabalhar, e misturar as coisas nunca daria certo. Fora a bagagem que carrego que nao quero impor a outra pessoa. Sem dizer mais nenhuma palavra, andamos pelo gramado, e surpreendentemente me sinto feliz. Mesmo estando a quilômetros de distância de casa, numa realidade totalmente fora de órbita. Mesmo estando de braços dados com um cara que mal conheço, e que ainda por cima é um policial. Um cara que me olha de 10 em 10 segundos com um sorriso infinito pendurado no rosto. Apesar do sol estar queimando minha pele, e do meu estômago estar reclamando, me encontro contente sem um motivo certo. Talvez seja a felicidade de saber que cheguei ate aqui sem nenhuma visao me pertubando. Que, como a presidente Branca disse, eu iria mudar vidas. Talvez, comecasse mudando a minha.
Depois de muitos metros seguindo pela calçada a direita chegamos no portão de entrada do condomínio. Ele é gradeado e podemos ver atraves dele os quatro prédios, e o restante do ambiente. Tudo é simplesmente lindo. Os prédios possuem vidros espelhados e um design sofisticado contando com uma fachada cheia de ondas singulares. No térreo, ele tem um pequeno terraço onde ficam as portas de vidro. Um gramado circula toda a área entre os prédios e um caminho de pedra liga uma pequena rua a cada um deles.
O soldado Wellington olha para o lugar com um olhar contente e de saudade. Então, lembro que ele deve ter vivido aqui por um tempo já que foi um Aluno Padrão. Nos encaramos de frente, e eu sei que deveria me sentir de algum modo constrangida e nervosa, mas pelo contrário, é mais como se nos conhecessemos a muito tempo. Vejo nele uma especie de amigo. O que é estranho.
- Senhorita Alice...
- Pode me chamar de Alice.
- Ok. Bem, Alice, não creio que seja apropriado que a leve agora até o seu dormitório. Então, nos despedimos aqui. Mas voltarei mais tarde.
- Estou muito curiosa. Ainda não acredito que não vai me contar o que sabe.
- É um assunto delicado. Não posso lhe dizer agora.
- Delicado? Nao entendo. E nem acho certo que nos encontremos escondidos. Acabei de chegar. E, Lucia poderia dar por minha falta e suspeitar.
Ele passa uma mão sobre o queixo analisando minha pergunta.
- Amanha quando voce for visitar sua secao, estarei te esperando. Ai poderemos nos falar.
- Tudo bem. - silencio. - Acho melhor eu entrar agora, Wellington.
- Certo. Até amanha, Alice.
Ele ergue uma mão para mim e a aperto. Então, ele sorri e se vai. Sinto meu pulso acelerando mesmo que ele não esteja mais aqui e me pego pensando em suas palavras e imaginando o que ele poderia querer me contar de tão importante que precise ser confidencial.
Entro no primeiro prédio a esquerda, e me deparo com uma pequena sala com dois sofás brancos em uma salinha e um corredor a direita que termina em um elevador. Ele se abre quando me aproximo e se fecha quando entro. Clico o número 3 no painel e espero. Observo meu reflexo nas paredes espelhadas ao redor. Eu pareço de alguma forma mais... viva. E um sorriso brota em meus lábios quando lembro dele. Não. Não, Alice. Foco. Foco. Foc... Fo... We... Eu não posso me deixar levar assim só porque estou imaginando que talvez... Talvez ele estivesse mentindo para mim e usando tudo isso como um pretesto para me ver. Como em um encontro. O que seria totalmente absurdo ja que so nos vimos duas vezes.
Passo minhas mãos pelos meus cabelos tentando alinhar meus pensamentos. Tentando afastá-lo deles. Isso não pode ser normal. Pensar em uma pessoa assim do nada. Sem nem conhecê-la. Antes que eu consiga diminuir o rubor do meu rosto, a porta se abre. Duas garotas me encaram do lado oposto antes de entrarem e só então volto a realidade. Caminho em direção ao final do corredor. Ultimo quarto. Passo o cartão na tranca de segurança e a porta desliza para dentro de um orifício na parede. Encaro um quarto tão lindo que me tira o fôlego. Mas assim que vejo Lucia sentada na minha cama com uma expressão chateada no rosto, meu humor desaba.
- Pensei que teria que ir buscá-la. - ela diz se levantando. - Posso saber, o que tanto conversou com aquele policial?
Que petulante!
- Ei! Você não acha que está sendo radical demais? Sabe, existe uma coisa chamada limites.
- Eu estava pensando exatamente isso enquanto você se divertia lá fora. - diz com o cenho apertado. - E, saiba que sei muito bem até onde vão os limites do meu trabalho.
Nos encaramos por alguns segundos cientes da negatividade entre nós.
- Deixei alguns papéis na escrivaninha que quero que você olhe. São os horários e locais que iremos visitar amanhã. E, não se esqueça que o TR vale aqui.
Ela faz uma breve parada.
- Não saia do quarto hoje. Você não conhece a cidade e poderia se perder. - ela mexe na bolsa procurando alguma coisa. - Poderá falar com seus pais via teleconferência. Os horários estão no mural. Qualquer dúvida pode me ligar. Só voltarei para cá amanhã quando vier lhe buscar.
- É só isso?
- Bem, se quiser comer alguma coisa você faz o pedido naquela tela ali. - ela aponta para uma LED ao lado da cama. - Depois de uns minutos a comida aparecerá. Entendeu tudo?
- Claro.
- Tudo bem. - ela vai em direção a porta que se abre automatimente. - E, lembre-se que está sendo vigiada. Não é porque não estarei aqui que poderá fazer o que quer.
Ela sai sem dizer mais nada e a porta se tranca novamente. Suspiro. Ainda bem que só terei que aguentá-la por alguns dias. Jogo a mochila sobre a cama king size e me sento observando os detalhes. A parede atrás da cabeceira da cama é de um tom de roxo escuro. O resto das paredes são brancas. Uma escrivaninha estilosa ocupa um grande espaço na parede dos fundos e uma janela grande fica logo atrás. A outra parede possui uma porta para o banheiro e um enorme guarda roupa preto. O piso do quarto é de porcelanato branco. É simplesmente aconchegante. É muito mais do que meu pai poderia sonhar em me dar. É mais do que eu ja esperei ter. Ao lembrar de Eduardo, sinto uma mão invisível esmagando meu peito. A saudade de casa é enorme. Decido que após comer irei ligar para ele.
Abro a mochila e retiro todas as coisas de dentro e a caixa de itens auxiliares. Pego as poucas roupas que trouxe e vou em direção ao guarda roupa. Quando o abro levo um susto. São tantas roupas que parece uma ilusão de óptica. Não só roupas, como diversos calçados. E tudo parece do meu tamanho. Percebo que não vou precisar das que trouxe. São tão velhinhas perto das outras que parece um insulto juntá-las. Guardo-as na mochila e a jogo em um canto do guarda roupa. Vou para o banheiro que não me chama muita atenção e tomo um banho rápido. Escolho uma blusa cinza de mangas longas, um short preto desfiado e um vans preto. Arrumo meu cabelo com os dedos e aplico um spray selador que estava na bancada do banheiro junto com inúmeros frascos. Vai que alguem resolve aparecer de surpresa. Nao quero que me vejam desalinhada.
Me sento na cama e olho para a tela de LED embutida na parede com certo receio. Assim que minha mão se aprixima dela, sou detectada e a tela acende. Várias opcões aparecem como café da manhã, almoço, jantar ou lanche. Clico em almoço e um cardápio bem variado aparece. Clico em filé á moranga acompanhado de arroz e salada, e para sobremesa flan de chocolate. Aguarde. Seu pedido esta sendo processado. aparece na tela. Depois de alguns minutos, uma parte da parede desliza para cima e me assusto quando uma mesa se projeta do orificio com a comida desposta em cima. O cheiro é maravilhoso e o sabor também. Quando termino a mesa volta automaticamente para seu lugar e o buraco volta a se fechar.
Me deito e pego o celular de dentro da caixa. Assim que o visor acende vejo 10 ligações perdidas e 6 mensagens no KickApp. Clico no símbolo do app e o nome Alexia aparece na tela.
» Alexia (online)
Cadê você? Te procurei em todos os lugares. (10:20 hrs)
Me dê um sinal de vida, sua nerdzinha de m... (10:21 hrs)
Você está aqui no Hall? (11:00 hrs)
Wow. Essa Holtz tem uma lábia. PQP! Adoro essa mulher! (11:15 hrs)
Minha seção é o MÁXIMO! Tu não ta entendendo!! É alto padrão. Tecnologia sem fronteiras! (11:40 hrs)
Quando parar de me ignorar é só avisar, ok? (13:00 hrs)

Alexia sendo Alexia. Digito uma mensagem...

» Alice (online)
Estava sem meu celular. Quer dizer, ele estava na caixa. E, bem, como conseguiu meu número? (13:10 hrs)

» Alexia (online)
Nao me apronte uma dessas novamente! Pensei que voce tinha desistido, sua vad... O que é que eu não sei, hein? :v rs Agora me diz, o que achou de tudo isso? Já comeu?

» Alice
Pare de xingar. Que feio! :o Estou gostando de tudo. Apesar de algumas coisas estranhas. Já comi sim. rsrs Pirou muito?

» Alexia
Alice Avelar, pode já começar a digitar uma explicação! Que coisas estranhas? Só se for essa tecnologia monstruosa! Gritei quando a parede se abriu. Não estava preparada para aquilo.
» Ei, me desculpe aí, mas minha secretária quer me repassar umas informações sobre amanhã. Ela é um amor! Nos falamos mais tarde?

» Alice
Que sorte! A minha está mais para o diabo. Estou sem paciência com ela. Até mais tarde, então.

Deixo o celular cair ao meu lado enquanto meus pensamentos me tomam. Sera que Wellington descobriu que sou uma inoperante? Sera que ele quer me denunciar para ficar com o cargo? Sera que ele é ruim a esse ponto? So consigo imaginar que seja por isso que ele queira conversar comigo a sos. Para me colocar contra a parede para que eu diga a verdade. Talvez, ele tente me subornar para que eu desista. Acho que nao devo confiar nele. Mas, parte de mim nao quer que isso se confirme. Uma parte de mim esta totalmente confusa.
Lembro de ele ter dito que eu seria sua auxiliar. O que me parece estranho já que ele é só um subordinado. Isso só seria possível, se bem, o Policial Chefe não estivesse mais trabalhando no cargo. E para isso só existem duas opções: ou ele se aposentou ou morreu. Acho que prefiro a primeira opção, mesmo que seja mais provável a segunda já que o assunto requer certa urgência. E se for isso... Eu não quero nem pensar.
Como vou conseguir aguardar ate amanha para saber? Porem, nao posso sair assim atras dele. Nao é porque ele foi o primeiro policial com o qual consegui realmente conversar desde a primeira vez em que o vi que isso indique que meus surtos acabaram. Sei que esta longe disso ser verdade. Mas, tambem nao sei explicar o que sinto quando penso nele. Nunca imaginei alguem assim.
Me pergunto como sera que vou suportar ver os estudantes da minha secao inteira fardados. Caí diretamente onde meu pesadelo estava mais proximo de se tornar realidade de uma maneira totalmente pertubadora. Como eu poderia esquecer tudo aquilo? As vezes, se eu ficava por muito tempo sozinha, podia ouvir a voz de Jackson viva em meus ouvidos. Em alguns momentos, podia ver seu fantasma tomando forma fora da minha mente. As lembrancas eram tao fortes que eu podia ve-lo nitidamente. Nessas horas, eu ficava anestesiada, a respiracao pesada, o coracao pulsando enlouquecido pela vida. Gritava, e chorava ate que Eduardo chegava e tudo se dissolvia.
Entao, como posso encarar tudo isso de frente fingindo que nao sou o que sou? Como podiam esperar isso de mim? Talvez, eu devesse desistir, voltar para meu estado, entrar na pre-selecao da Secretaria e esquecer meus pais. Desistir dessa tentaiva de dar a volta por cima. Eu posso estar fazendo a escolha errada. Meu pai pode ter enlouquecido, e ser um inoperante fingindo ser alguem normal. Se escondendo dentro de si. Nao faco a minima ideia do que ele quer que eu faca e nem onde vou encontrar essa resposta.
Me remexo na cama tentando afastar os pensamentos, mas acabo não encontrando muita resistencia, e sou levada a um sono pesado, sem sonhos.

                          +++

Desperto meio grogue, e sem saber onde estou. É sempre estranho acordar em um lugar diferente da sua casa. Pego o celular ao meu lado, e vejo que já sao 19:55 hrs. Dormi bastante, e ja é quase hora do TR. Me levanto e vou ao banheiro. Olho meu reflexo no espelho e percebo meu rosto inchado e amassado, e meus olhos me lembram um panda. Lavo o rosto retirando o lapis e o brilho labial. Volto para o quarto, e olho a paisagem pela janela. Ha uma arvore bem proxima a parede e alguns galhos grossos chegam ate o parapeito da janela. O predio vizinho esta distante apenas alguns metros e vejo luzes acesas em quase todos os andares.
De repente, ouço a "amada" sirene do TR ecoar pelo predio e uma coisa pela qual eu nao esperava acontece. Uma folha de metal escorrega pelo vidro da janela trancando-a, e me impossibilitando de ver qualquer coisa la fora. Realmente, eles nos querem confinados. Volto para cama  e toco a tela de LED pedindo meu jantar. Como tristemente imaginando como meus pais estariam se sentindo em casa. Imagino que estejam com saudade. Ate mesmo Amarilis.
Assim que acabo percebo que nao tenho nada para fazer, e estou completamente sozinha. Preciso procurar algo para fazer antes que "Jackson" venha me fazer companhia. Pego meu celular e envio uma mensagem para Alexia pelo KickApp.

» Alice (on line)
O que voce esta fazendo? Me sinto completamente entediada...
(20:20 hrs)

» Alexia (online)
Estou me divertindo muitissimooo! - sqn -.- Somos duas, querida. Me conte que historia é essa de voce ja estar arrumando confusao com sua secretaria! (20:21 hrs)

» Alice:
Eu nao estou arrumando confusao com ninguem. Ela que é bem rispida comigo. Estou sem cabeca para lidar com ela.

» Alexia
Hum. Faca como eu faria: coloque ela em seu devido lugar! Jaja voce se formara e podera dar uma dura nela!
A minha, é o oposto da sua um amor! Voce deveria conhecer Diana. Ela é bem eficiente, e faz tudo o que mando. rs

» Alice
Nao va judiar da coitada! rs Oh, Alexia... queria que voce estivesse aqui.

» Alexia
Finja que estou do seu lado e me conte tudo. Mas por aqui. rsrs So nao va me dizer que esta prestes a surtar.

» Alice
Estou, mas nao dessa maneira. Voce lembra do soldado Wellington? Bem, ele veio com uma conversa bem estranha para o meu lado. Amanha conversarei melhor com ele.

» Alexia
Lembro sim. Como me esqueceria de um gato daqueles? Ele esta afim de voce? É isso? Sinto cheiro de coracoes.

» Alice
Nao sei. Mas, creio que nao seja isso. Amanha saberei.

» Alexia
Nao deixe de me contar nada. Por favor, quero ser a primeira a saber.

» Alice
E, a alguem mais para o qual eu contaria? Pare de besteira. Nao a nada entre eu e ele. NADA.

» Alexia
Sei. Amada, estou EXAUSTA. Me desculpe por nao ficar mais. Preciso domir. Faca o mesmo.

» Alice
Pode deixar. Ate amanha.

Era isso. La estava eu, o eco do vazio e meus pensamentos preenchidos por um sorriso gigantesco. Como eu podia voltar a lembrar dele? Era a loucura.

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